Esports é esporte, mas não é tão simples assim.
Sim, é isso mesmo que você leu no título: esports é esporte. Mas nada é tão simples assim, entendo as declarações da ministra Ana Moser, mas claramente ela não sabe o que está falando.
É esporte. Ponto final.
É preciso preparo, times e, muito diferente do que a ministra dos esportes colocou, não é um treino como o da cantora Ivete Sangalo. Nada é tão simples quanto parece nessa discussão e o importante seria verdadeiramente existir uma discussão.
Entendo a problemática onde cada esporte é uma propriedade intelectual de uma empresa. Mas é preciso entender que os atletas ali envolvidos treinam e precisam ser protegidos pela lei como todo atleta.
Tal proteção só pode ser dada e garantida pelo governo federal, aliás no Senado a Lei Geral do Esporte, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Esporte, a Ordem Econômica Esportiva, a Integridade Esportiva, o Plano Nacional para a Cultura de Paz no Esporte correr na pasta de Política Social, Desporto e Lazer.
E essa discussão é importante para esfregar na cara de algumas pessoas uma fala necessária para nerdolas e liberais: viu como até videogame é política?
Campeonato de propriedade intelectual
Confesso que esta é, na minha opinião, a parte mais complicada na concepção de e-sports como esporte. Afinal não há um campeonato de FPS, há campeonatos de Counter Strike e Overwatch.
A questão é estes jogos já tem grandes corporações que trabalham suas próprias mecânicas e regras. Não há um órgão – privado ou não – no mundo que determine regras para que um FPS possa ser considerado esport ou não. Isso traz dificuldade para normatizar uma categoria, mesmo com tal dificuldade não deveria ser um empecilho.
Se você se perguntar se devemos fomentar jogos ou atletas, com certeza ficarei sempre com a segunda opção.
É importante lembrar – inclusive nossa ministra – que o COI (Comitê Olímpico Internacional) anunciou que Singapura será sede da Semana Olímpica de Esports em 2023. Além disso, em setembro de 2022, os Jogos Olímpicos Asiáticos tiveram competições de esports. Foram disputadas medalhas de League of Legends, FIFA e DotA 2. Foi a primeira vez que o evento do Comitê Olímpico Internacional, equivalente aos nossos Jogos Pan-Americanos, deu medalhas para esports.
Porém, independente da propriedade intelectual, a principal preocupação deve ser o atleta, assim como em qualquer esporte.
E o PT? E o Lula Play?
O Lula Play foi uma cartilha elaborada por jornalistas, especialistas e estudiosos dos games no Brasil. Enquanto me reservo para algumas críticas pontuais é preciso entender que é o primeiro passo para mais um mercado abandonado no país sem lei de incentivo e fortalecimento.
A cartilha elaborada antes da eleição demonstrava muita preocupação quanto a profissionalização e a proteção jurídica dos que já atuam como atletas. Há a preocupação de incentivo à bolsas de ensino superior para atletas de esports vinculadas ao Ministério dos Esportes e da Educação, por exemplo.
Mas preciso comentar também o quanto, cada vez mais, os atletas de esports são jovens e pouco protegidos pelas empresas que os contratam. Estes atletas são mais uma classe precarizada por grandes corporações e descartada antes de atingir seu ápice.
Organizações exploram atletas jovens e os descartam antes de um amadurecimento emocional e intelectual suficiente para lidar com situações diversas. Proteção ao trabalhador da área é imprescindível para um mercado saudável para, aí sim, mostrar o poder social de transformação dos jogos eletrônicos.
Sacada errada da Ana Moser
O Ministério dos Esportes é uma das pastas com menores orçamentos e, em tempo de reconstrução, tem menos dinheiro ainda. O ministério pretende buscar ajuda de outros, como Saúde, Educação e até Desenvolvimento Social para implementar suas políticas. Não é uma situação fácil.
Convenhamos que dar parte desse escasso orçamento para a Riot fazer um campeonato de League of Legends é extremamente problemático. O LOLzinho não precisa de dinheiro público. quem precisa de aparo público é o atleta.
Os chamados esportes da mente são considerados esportes querida ministra. Pôquer, bridge, damas, go e xadrez se caracterizam como esporte por ter caráter competitivo, regras fixas e são vinculados a Federações e Confederações, para regulamentar as regras.
Se pegarmos a fala de Ana Moser, estes esportes também não seriam esportes.
A exclusão não resolve a questão e, inegavelmente, a ministra poderia ter expressado melhor.
À frente da ONG Atletas pelo Brasil a ministra atuou para que a Lei Geral do Esporte não deixasse o conceito de esporte “amplo” suficiente para incluir esports. Atletas convencionais sabotaram a possibilidade de jovens atletas de esports terem mais segurança no trabalho.
Os esports são considerados esportes pelo governo da Coreia do Sul já faz um bom tempo. Talvez seja importante a ministra dar uma olhada em alguns documentários gamers.
Abraço pros gamers! ?
A família Bolsonaro aproveitou mais uma vez o engajamento dos gamers para falar merda. Obviamente a posição sobre esports causou revolta dos videogameiros. De férias em SC, Jair Renan, foi o mais irado – lembrando que ele foi banido da plataforma Twitch por discurso mentiroso sobre vacinas. Carlos, que praticava o esport no gabinete, destilou transfobia. Mas não dá para se surpreeender com essa galera mesmo.
Jogador de LOLzinho e jogador de Destiny 2 querem que seu passatempo seja considerado esporte? Estranho que enquanto o pai deles estava no governo isso não foi visto né? Estranho.
Mas que fique claro que, independente do que a Ministra Ana Moser acredita, é preciso atuar em favor dos atletas de esports com urgência. esports é esporte e, mais uma vez, a discussão não deve ser sobre os jogos, mas sobre o atleta e suas condições de trabalho.