Em 17776 o mundo é outro, mas se parece com o seu mundo.
A obra digital 17776 foi uma das experiências mais surpreendentes que tive neste ano e resolvi que precisava falar isso aqui no blog. Sim, há spoilers mas preciso que entenda algo importante: estas são as minhas impressões, erradas ou não descrevo aqui o que entendi e vi. É meu ponto de vista, do meu âmago diretamente para a internet. Aviso também que escrevo isto mais como um apontamento do que uma análise. Afinal esta peça de Jon Bois é altamente interpretativa, logo cada pessoa terá uma experiência diferente.
O site SBNation, especializado em notícias de esportes nos EUA, ainda é o hospedeiro da obra publicada em 2017. Não faço ideia o que se passa na cabeça do editor de permitir tal publicação, algo tão experimental, em seu domínio. Neste conto o futebol americano é importante, mas é apenas um dos pontos desta história.
O Henrique do Nautilus foi quem indicou essa leitura e eu, em uma busca absurda por novas maneiras de contar histórias mergulhei na experiência. Ando procurando boas histórias, mas diferentes, que não sigam a jornada do herói ou que tenham várias camadas. E este conto tem tudo isso.
Imagine um mundo com mais de 17.000 anos, nele, no ano 2026, as pessoas simplesmente pararam de morrer. Satélites conscientes e pessoas sofrendo escassez de mistério jogando jogos impossíveis que servem apenas como passatempo. “Apenas” mas é tudo que eles realmente têm: todo o tempo (literalmente) do mundo. Sem mencionar que a população resolveu que o estilo de vida ideal, que completa suas vidas, é o que se parece com o final dos anos 1980. Incluindo minivans. Além disso criaram uma rede mundial de proteção onde nano robôs salvam todas as pessoas de qualquer coisa, inclusive sintetizam comida se preciso.
Tudo começa com satélites espaciais conversando casualmente e acordando um irmão mais velho. Nine, Ten e Juice usam seu ponto de vista privilegiado para questionar e vislumbrar uma humanidade com mais de 3 bilhões de imortais vagando pela Terra e americanos jogando futebol americano (sic) de maneiras que as Olimpíadas do Faustão ou Fall Guys invejariam.
Existem momentos de diálogos excessivos que quase me afastaram da trama, mas a curiosidade de saber o destino daquele mundo. Saber toda a história de Nine me mantive firme naquela doideira. O diálogo de Nancy McGunnell e Nine é divertido, mas não me prendeu tanto quanto o momento que sua bateria acaba e ele diz que precisa ver Nova Iorque inundada.
Mas a pergunta principal mesmo é quanto a existência de um deus monoteísta. Hoje não acredito que exista uma força superior, talvez eu seja como Ten. Para mim a história é um ensaio sobre a vida eterna do ponto de vista humano – limitado e fincado à Terra. Já fui muito religioso em algumas religiões, faz mais de uma década que me tornei ateu, mas não esqueci o que passei e o que senti enquanto tinha fé em um ser superior.
Apesar disso, não há como saber se aquele mundo cheio de imortais seria o céu ou o inferno bíblico.
Em diversas religiões a vida eterna é mostrada como o maior prêmio de todos, aquele prêmio que só quem passar por todos os testes de seu deus poderá obter. Porém, nenhuma das religiões que frequentei não falavam claramente o que seria feito com este prêmio. Uma professora (sic) uma vez me disse que todos iriam ter vidas simples e ficaríamos plantando nosso alimento aos pés do trono do criador pela eternidade. Ouvi tal relato quando era adolescente e mesmo na época, mesmo com fé, me pareceu algo complicado.
Por quê iríamos penar na Terra por anos para ficar eternamente arando? Por estudar em um colégio com religião sem nenhuma filosofia fiquei com a minha dúvida. Na interpretação da religião eu deveria simplesmente aceitar, afinal era essa a vontade daquele deus.
17776 me trouxe essa lembrança, hoje essa questão realmente não me trás o alvoroço da época. Hoje não me importo realmente com isto por não acreditar. Porém, no meu ponto de vista, não é difícil entender o motivo daqueles humanos com quase 18.000 anos de idade estarem entediados, eu também estaria. E você? E a carazi?
Uma resposta em “17776”
[…] isso que leio coisas como 17776 e escrevo coisas como a origem da Carazi. Tudo em nome do […]