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Você se lembra do primeiro post que você leu em uma rede social hoje?

Você não se lembra do primeiro post que você leu em uma rede social hoje. Eu sei.

Este artigo precisa ser lido depois dos primeiros minutos da manhã. Depois de você ter acordado, depois de acessar sua rede social favorita e mergulhar no seu algoritmo enquanto escova os dentes ou esta sentado na privada. A razão para isso é para explicar – e mostrar – que a quantidade de informações que você recebe é tão irrelevante que você nem se lembra do que viu.

Mas não se preocupe, não se lembrar pode ser considerado normal dependendo da conjuntura. Seu cérebro está ocupado demais tentando processar o equivalente digital a 174 jornais por dia… E nem preciso afirmar que a grande maioria deles quer te vender pizza ou te mostrar gatinhos feitos em IA.

O inferno do scroll infinito tem nome: sobrecarga cognitiva. Estamos consumindo mais de 8 horas de mídia digital por dia. Só em redes sociais, a média global chega a 143 minutos diários. É conteúdo demais, cérebro de menos.

Estudos mostram que processar quantidades massivas de informação nas redes sociais consome energia cognitiva até causar fadiga mental. Seu cérebro literalmente cansa de tanto post, story, thread e tweet. E quando ele cansa, você perde flexibilidade mental, comete mais erros, afeta sua ansiedade, pode causar depressão e sua eficiência fica comprometida.

Sempre lembrando que um profissional da saúde deve ser consultado para um diagnóstico apropriado.

Você se lembra do primeiro post que você leu numa rede social hoje - Símbolo de ômega incorporado no logo do Instagram pingando tinta com Darkseid olhando ao fundo - blog FAROFEIROS

O capitalismo da atenção cobra seu preço

As plataformas não são burras, elas sabem que quando há sobrecarga de informação você seleciona o que compartilhar e o que ignorar. E informação compete pela sua atenção como uma doença não consegue competir. Por isso o algoritmo te joga todo tipo de conteúdo: quanto mais você vê, mais você fica, mais dados você gera. Mais anúncios você vê.

O resultado é uma fadiga de redes sociais que aumenta sua propensão a acreditar e compartilhar desinformação. Sabe aquela fake news absurda? Ela é uma ferramenta de engajamento que atrai um grande número de pessoas, gerando lucro.

Quando seu cérebro está exausto de processar 400 stories por dia, fica mais fácil compartilhar sem checar os fatos ou sem notar o terceiro olho na testa do homem ao fundo do vídeo de mentira feito em IA.

A sobrecarga informações prejudica diretamente a checagem de fatos sobre saúde, isso foi estudado durante a pandemia de COVID-19, quando informação de qualidade era literalmente questão de vida ou morte… E mesmo assim plataformas ganharam rios de dinheiro com desinformação enquanto pessoas morriam.

Você se lembra do primeiro post que você leu numa rede social hoje - Darkseid dos quadrinhos usa o poder do mal do instagram com raios vermelhos saindo da logo da rede social - blog FAROFEIROS

Você não vai ficar bem informado

Você abre o Instagram para “se informar”, surgem 50 posts sobre política, 30 sobre crise climática, 80 memes feitos com IA, 15 propagandas disfarçadas de conteúdo autoral de coach.

E fecha o app.

E não lembra de nada.

Nicholas Carr, ex-editor executivo da Harvard Business Review, compara e-mail e redes sociais a “apertar alavancas sem parar na esperança de receber uma pelota de alimento social ou intelectual“, nos comparando a ratos de laboratório com smartphones.

Pesquisas recentes integram a teoria da sobrecarga cognitiva, a teoria da comparação social e a teoria cognitiva social para explicar como fatores como sobrecarga informacional, uso compulsivo e FOMO (Fear Of Missing Out, ou, medo de ficar de fora) levam à fadiga emocional. Colocando de maneira mais simples: as redes sociais foram desenhadas para te viciar e te esgotar ao mesmo tempo.

Você se lembra do primeiro post que você leu numa rede social hoje - Raios ômega difusos saem do controle de Darkseid com o logo branco do Instagram na frente de seu rosto - blog FAROFEIROS

Hora de deletar tudo?

Não é preciso se tornar um eremita digital, mas vale pensar: você está consumindo a rede social ou sendo consumido por ela?

Estudos comprovam que maior letramento em mídias sociais reduz a sobrecarga de informação percebida. Ou seja: aprender a usar redes sociais de maneira crítica, filtrando, questionando e verificando antes de compartilhar, pode fazer uma diferença real na sua saúde mental.

Uma meta-análise recente sobre sobrecarga cognitiva em redes sociais descobriu que ela afeta tanto exaustão quanto vício, reduz performance no trabalho e aumenta a intenção de abandonar as plataformas.

Mas nada é tão simples assim, como reportado pela Reuters, a Meta (dona do Instagram, Facebook e Whatsapp) encobriu uma pesquisa da própria empresa que apontou que desativar o Facebook reduzia a ansiedade, a depressão e os sentimentos de solidão.

Aparentemente Nick Clegg, então chefe de políticas públicas globais da empresa, solicitou a Mark Zuckerberg mais verbas para segurança infantil, mas teve seu pedido rejeitado ou foi ignorado, segundo os documentos.

Da próxima vez que você abrir uma rede social e passar 40 minutos sem perceber, tente lembrar do primeiro post que viu. Não consegue? Parabéns, você acabou de experimentar o futuro que a gente normalizou. E ele não é bonito.

Por Rodrigo Castro

Debochado e inconveniente. Escritor, roteirista e designer de brincadeirinha.

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