Licença-paternidade é mais do que um direito: é uma política de futuro.
Quando se fala em licença-paternidade, muita gente ainda enxerga o tema apenas como um benefício restrito à vida familiar. Mas essa é uma visão bastante limitada.
O debate sobre ampliar o tempo de licença para os pais vai muito além da relação com os filhos: ele toca em temas centrais como mundo do trabalho, economia, igualdade de gênero e até a construção de uma sociedade mais focada no bem viver.
Mais do que um gesto simbólico, a ampliação da licença-paternidade representa uma mudança estrutural que impacta diretamente na distribuição das responsabilidades de cuidado, na saúde mental das mães e na dinâmica do mercado de trabalho.

O que o mundo já entendeu sobre isso?
Países que saíram na frente com políticas mais generosas de licença para os pais estão colhendo resultados sociais e econômicos concretos.
Na Suécia, por exemplo, os famosos “latte dads” (pais que dividem igualmente os cuidados com os filhos e ainda curtem um café com os pequenos durante o dia) são vistos como símbolo de equilíbrio de gênero. Por lá, os pais têm direito a 90 dias exclusivos dentro de um total de 480 dias de licença parental.
No Reino Unido, mesmo com uma licença ainda muito curta (apenas duas semanas atualmente), movimentos como o Dad Shift e protestos conhecidos como “Dad Strikes” têm pressionado pelo menos seis semanas de licença paga. Estudos britânicos mostram que ampliar a licença para os pais poderia gerar um impacto positivo de mais de £2 bilhões por ano na economia, por conta do aumento da participação feminina no mercado e da redução da desigualdade.
Ampliar a licença-paternidade é uma medida que:
- Melhora a saúde mental das mães (menos casos de depressão pós-parto)
- Aumenta o vínculo afetivo dos pais com os filhos
- Reduz a desigualdade de gênero no mercado de trabalho
- Gera impacto positivo na economia com mais mulheres trabalhando e mais estabilidade familiar
Pesquisas indicam que cada mês adicional de licença-paternidade pode aumentar em até 7% o salário materno ao longo dos anos seguintes, graças à maior divisão de tarefas e à volta mais rápida ao mercado de trabalho.
E o Brasil, finalmente, começou a mexer nisso
A Câmara dos Deputados aprovou um projeto que amplia a licença-paternidade de forma gradual: 10 dias nos dois primeiros anos de vigência; 15 dias no terceiro ano e 20 dias no quarto ano. Pais de crianças com deficiência terão ainda mais tempo.
A licença vale para pais biológicos, adotivos ou quem assume a guarda, e o salário segue garantido porque o filho não se cria no fiado da farmácia e do mercado.
É simples: a presença importa. E política pública pode garantir essa presença.

Mas vamos ser sinceros: não foi fácil
A luta foi pelos 30 dias. Sim, trinta. Um mísero mês. E, pasmem, teve certo apoio de parlamentares da esquerda, da direita e até o centrão olhou e falou “é… talvez o pai possa conhecer o filho”.
Só que o projeto estava mais travado que o grupo de WhatsApp da família em época de eleição. E negociar algo além dos 15 dias foi tipo explicar que a Galinha Pintadinha não é da União Soviética.
Então, sim, não chegou no ideal. Mas a porta abriu. Esse é o momento em que a sociedade finalmente começa a dizer: Pai não é visita. Pai não “ajuda”. Pai cuida porque é pai.
E quando o Estado reconhece isso, a cultura muda junto. Devagar? Sim. Com barulho? Sempre. Mas muda. Se queremos uma sociedade menos desigual, a mudança começa no berço. Com tempo, com cuidado, com responsabilidade compartilhada.
Licença-paternidade não é mimo. É política pública, é economia, é saúde, é futuro. E como toda boa mudança cultural no Brasil: vai na marra, na insistência e com muita farofa.
