Sem memória não há futuro: relembrando o Golpe de 64.
Por mais que tenhamos falado do Golpe de 64 no Farofeiros Cast #171 sempre parece que não falamos o suficiente. Obviamente recomendamos que ouça o podcast ou veja a gravação no YouTube, mas temos um rico material que poderá ser útil para você se informar ou estudar. Como sempre, tudo acompanhado de links confiáveis e pertinentes.
Em nome de tudo e todos que perdemos é preciso agradecer a resistência e sua resiliência. Este texto é também, por que não, uma homenagem a todos vocês.
Abaixo você encontra a adaptação da nossa pauta para o podcast criada primariamente por Paola Costa, com introdução minha. Vale a pena a consulta, vale a pena lembrar, pois sem memória não há futuro.
INTRODUÇÃO
No dia 31 de Março de 1964 uma junta militar assumiu o poder no Brasil após forçar o exílio no então presidente João Goulart. Logo em seguida o primeiro presidente da ditadura militar toma posse. Foram 21 anos, 5 mandatos militares, 16 atos institucionais que sobrepuseram à Constituição Federal restringindo a liberdade, reprimindo e censurando a população.
Nos 60 anos do golpe militar, um estudo aponta que cerca de 1654 camponeses foram mortos – ou desapareceram – durante a ditadura. Em 2014 a Comissão Nacional da Verdade confirmou 434 mortes ou desaparecimentos de vítimas da ditadura militar.
O mito de que na Ditadura Militar as cidades não eram violentas só sobrevivem ao discurso bolsonarista. Na época a violência urbana cresceu e a taxa de homicídio atingiu números alarmantes. A diferença é que a imprensa era censurada e proibida de divulgar os problemas. Se o povo não vê, o povo não sente.
E tem gente querendo que você acredite em uma verdade paralela, onde militares eram os mocinhos dessa sangrenta história. Mas tem um motivo, afinal Igrejas colaboraram com a ditadura no Brasil, a grande imprensa apoiou a ditadura enquanto servia seus interesses, a violência da Polícia do Rio. Grupos de extermínio e, por fim, a ditadura idealizou as milícias.
A estrutura da milícia foi montada na ditadura, segundo o sociólogo José Cláudio Souza Alves, professor da UFRRJ.
Problemas antigos potencializados e aprimorados, graças à ditadura militar. Suas consequências então nos noticiários até hoje. Marielle foi morta para que Brazão conseguisse aprovar PL de grilagem de terras na zona oeste do Rio supostamente.
O caso Marielle evidencia que a militarização ditatorial persiste e resiste, por isso não podemos mais pensar em anistia para clube do bolinha patrocinado pelo nosso dinheiro para usar uniforme e matar o povo em nome de uma ordem que enche seus bolsos de dinheiro.
O governador carioca de São Paulo, Tarcisio, acha que é uma boa ideia homenagear general do regime ditatorial. Militar Antônio Erasmo Dias ficou conhecido por ser o responsável pela repressão ao movimento estudantil em 1977 enquanto era secretário de Segurança Pública. Nome foi dado a viaduto que fica em Paraguaçu Paulista.
A verdade não está na moda, o que está na moda é mentira absurda e resolução tosca. Por isso que hoje vemos os militares querendo, mais uma vez, anistia por seus crimes.
CONTEXTO DE ÉPOCA
Para entender o contexto da época é importante entender:
- João Goulart: o presidente que tinha alguns desafios diante da forte crise econômica que afligia o país, como reduzir as tensões entre sindicatos e empresários com fortes greves e afastar possíveis crises políticas. Para atenuar crises, Goulart apresentou um Plano Trienal elaborado pelos ministros do Planejamento (Celso Furtado) e da Fazenda (San Thiago Dantas) que procurava combater a inflação e ao mesmo tempo retomar o crescimento econômico que havia sido vislumbrado no final da década de 1950. O Plano inicialmente é bem visto pelos empresários, mas o reiterados pedidos de que trabalhadores se sacrificassem em nome da economia fizeram com que diversas manifestações populares ocorressem pelo país. De outro ponto, Jango também buscava uma conciliação com a classe trabalhadora e não levou muito para iniciar ações que ampliaram alguns direitos sociais.
- Florestan Fernandes (na obra Brasil, em compasso de espera) dizia que havia uma insatisfação da elite empresarial e militar com a possibilidade de uma transição do regime democrático-burguês para uma democracia de participação ampliada com crescente tomada de espaços políticos pela classe trabalhadora do campo e da cidade.
- Entre 1961 e 1963, o sindicalismo se ampliou e as atividades eram intensas em nome de reformas e mudanças nas estruturas. Também eram constantes as mobilizações contrárias ao “aperto de cintos” da classe trabalhadora que eram bradadas pelos ministros liberais de Goulart. A bem da verdade é que esses movimentos desagradaram empresários que viam nos movimentos de greve um caráter unicamente político (em um sentido ideológico e não socioeconômico). Além disso, havia insatisfação com o fato de que lideranças de movimentos grevistas fossem recebidas pelo presidente da República.
- Ainda no período do governo de João Goulart surgem as Ligas Camponesas, nascidas das lutas dos trabalhadores do campo que buscavam barrar as reiteradas tentativas de latifundiários e garimpeiros de expulsar pessoas de suas terras. Em alguns locais chegaram a ocorrer conflitos armados e assassinatos de trabalhadores a mando de latifundiários que temiam a politização das massas.
O GOLPE
- O golpe foi arquitetado e estruturado pelas chamadas facções/alas duras das Forças Armadas com apoio dos empresários brasileiros atrelados ao liberalismo e que se auto proclamavam nacionalistas.
- O golpe foi planejado e impulsionado pelas classes dominantes (elites nacionais). As classes sociais dominantes não aceitavam uma expansão de direitos sociais, nem a política dos trabalhadores.
- Observa-se que o golpe foi impulsionado pelas elites porque não se apresentavam sindicatos, organizações sociais e partidos de esquerda/progressistas nas manifestações antecedentes ao golpe que pediam a destituição de Goulart.
- Marcha da Família com Deus pela Liberdade: na “manifestação” haviam cartazes e faixas pedindo que as Forças Armadas salvassem o Brasil. Salvassem de quem? João Goulart, Leonel Brizola e do comunismo. Os movimentos se intensificaram com a adesão de setores da elite econômica, líderes religiosos, parlamentares, governadores e membros do governo dos Estados Unidos.
- 31 de Março de 1964: destacamento militar de Juiz de Fora (MG) iniciou a Operação Popeye que visava ocupar o então Estado da Guanabara (hoje RJ) e Brasília. Segundo Castelo Branco, o contingente militar era pequeno e se alguma resistência fosse apresentada o golpe não teria sucesso.
- 01 de Abril de 1964: Jango trabalhava no Palácio das Laranjeiras, no Rio, quando militares ainda discutiam se haveria o golpe de Estado pois alguns oficiais ainda insistiam na ideia de “emparedar” Jango sem ainda destituir o presidente. Ainda no dia 1º de Abril, Jango retornou para Brasília e pela noite partiu para Porto Alegre.
- 02 de Abril de 1964: declarada a vacância do cargo de presidente da República pelo Senado Federal. Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, foi interinamente empossado com comando nas mãos de ministros militares.
- Cabe derrubar aqui dois mitos criados: 1º) O golpe não foi Constitucional, como tentar abordar as viúvas da ditadura. Existiam três formas de um presidente sair do cargo considerando a Constituição da época (de 1946): impeachment, renúncia ou vacância de cargo. Nenhuma das opções legais era possível naquele momento. 2º) Auro de Moura Andrade, presidente do Senado, num ato ILEGAL declarou a vacância de cargo. Cabe salientar que diferente do que se afirma em alguns textos de militares, Jango ainda não havia deixado o Brasil em direção ao Uruguai quando declarada vacância. Jango estava no Rio Grande do Sul e tentava apoio do Comando Militar do Sul para evitar a tomada de poder pelos militares do Sudeste e sua inevitável destituição da presidência.
O DIA QUE DUROU 21 ANOS
- O golpe foi contra a democracia brasileira., contra a politização das massas, contra movimentos sociais, contra organizações de trabalhadores e para estancar os ricos debates ideológicos e culturais no país.
- Em 09 de Abril de 1964, o general Castello Branco foi “eleito” presidente do Brasil de forma indireta após o golpe militar seguido de golpe parlamentar.
- Alguns na época afirmaram que os militares haviam entrado no poder Executivo para barrar as revoltas populares e evitar uma convulsão social no Brasil. A verdade é que o governo que dizia que seria transitório durou 21 anos.
ATOS INSTITUCIONAIS DA DITADURA
- AI-1: 102 pessoas são citadas. 41 deputados tiveram seus mandatos cassados, 29 líderes sindicais perderam direitos políticos. Além disso, pessoas como Darcy Ribeiro, Luís Carlos Prestes, Leonel Brizola e Miguel Arraes também perderam seus direitos políticos. Mais de mil militares que se mostraram contrários ao golpe também foram listados e perseguidos.
- AI-2: outubro de 1965. Estabeleceu as eleições indiretas para presidência e dissolveu partidos políticos. Pluripartidarismo é extinto e é instituído o bipartidarismo.
- AI-3: fevereiro de 1966. Estende as eleições indiretas para os governos estaduais.
- AI-4: dezembro de 1966. Convoca o Congresso para votar uma nova Constituição que incorporaria os atos institucionais e todos os decretos promulgados nos primeiros anos da ditadura. A Carta Magna foi promulgada em 1967 e desconsiderou emendas propostas pela maior parte dos parlamentares. O Ai-4 também regulamenta a existência de dois partidos: Arena e MDB.
- AI-5: iniciou o período de maior repressão política, com emprego de mais violência e perseguições aqueles que fossem vistos como adversários dos militares e da extrema-direita brasileira. Ocorreu censura, prisões, torturas e assassinatos.
GOLPE DE JAIR BOLSONARO
- Estivemos muito próximos de um golpe de Estado em 2022.
- 08 de Janeiro de 2023: Vandalismo nas sedes dos Três Poderes em Brasília. e pedidos por intervenção militar permearam as ações golpistas.
- Vândalos, autores intelectuais e financiadores estão sendo presos e progressivamente levados ao banco dos réus. Maioria tem penas entre 12 e 17 anos por crimes como associação criminosa, golpe de Estado e a abolição violenta do Estado Democrático de Direito.