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A magIA de demitir mais e produzir menos

Não é magia, é ganância: demitir mais e produzir menos é o que comanda a indústria dos games neste momento.

Existe algo acontecendo na indústria dos games que resume bem o momento que vivemos: bilionários defendendo inteligência artificial generativa enquanto demitem pessoas aos milhares. Estão se esforçando para demitir mais e produzir menos e se alguém ousa questionar isso numa crítica de jogo vira “opinião política“.

O jornalista Rick Lane, da Eurogamer, deu 2 de 5 estrelas para Arc Raiders, shooter de extração que usa IA generativa em dublagens. O jogo se passa num mundo tomado por robôs, e tem voz de robô. Usar vozes sintéticas num game sobre humanidade versus máquinas é mais do que ironia.

Mas Tim Sweeney, bilionário CEO da Epic Games, não gostou. No Twitter (ou esgoto), reclamou: “opiniões políticas deveriam ir para editoriais“.

Ai ai meu saco.

Sweeney tem razão apenas em um ponto: a discussão sobre IA generativa é política como aponta o texto do Rock Paper Shotgun (e eu concordo). Ao ser questionado se criticar IA seria mesmo um ato político o executivo soltou a fala neoliberal clássica afirmando que a tecnologia aumentaria a produtividade humana, e opiniões sobre se isso é bom ou ruim seriam especulativas (!?). Aparentemente o bilionário quis dizer que quem critica IA é pessimista ideológico enquanto quem defende está sendo pragmático e otimista. (sic)

O bilionário tenta separar a avaliação da arte das condições de sua criação colocando de lado a situação de trabalhadores que estão sendo gradualmente empobrecidos e excluídos. Ele argumenta que quando a tecnologia aumenta produtividade, a competição leva a jogos melhores, não menos empregos.

Pena que a no mundo real as coisas não funcionam assim.

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IA, desemprego e (muito) lucro

Hoje a Microsoft vale quatro trilhões de dólares em grande parte desse investimento chegou graças às promessas de revolução da IA. E mesmo assim não para de demitir funcionários em todos os setores – não só o de game.

A dona do Windows está colocando IA generativa em tudo, quer literalmente que a tecnologia se um “companheiro” que vai nos fazer “fazer mais” nas nossas vidas. A mesma Microsoft demitiu milhares de funcionários no início de 2025 obteve lucro líquido de US$ 27,2 bi.

Os cortes foram defendidos como um importante movimento para “realinhar para adoção global de IA generativa“.

A produtora Square-Enix, famosa por seus RPGs, declarou recentemente que pretende transformar em IA cerca de 70% do setor de Q&A e debugging com a ajuda da Universidade de Tóquio. O setor seria responsável por testes e controle de qualidade. Não foi confirmado quantas pessoas serão demitidas.

Há relatos de funcionários da Eletronic Arts estarem com dificuldades com a pressão da gerência para que utilizem IA para tudo. Os códigos de falhas da tecnologia precisam ser corrigidos manualmente e acabam atrasando mais ainda as tarefas.

Outros ainda temem que se trate de treinamento interno da IA alimentando a tecnologia com o próprio trabalho. Isso seria um recado, os designers, artistas e desenvolvedores estariam treinando a máquina que os irá substituir em breve – mais demoções à vista.

Em Abril de 2025 a Epic comprou a Loci, tecnologia de marcação 3D baseada em IA para “automatizar workflows de artistas” no Unreal Engine. A IA generativa é usada para dublar personagens no Fortnite. Tudo isso ignorando objeções de sindicatos de todas categorias.

Anos atrás a Epic Games Store foi apresentada como uma plataforma para jogos com materiais gerados por IA e ainda come poeira da Steam. Lembrando ainda que a Epic cagou mole no pau errou ao investir no metaverso talvez devêssemos desconfiar do amanhã que a IA promete.

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Luta de classes contra o robô do bilionário

Tudo é política. Literalmente.

E o bilionário Tim Sweeney acerta ao chamar essa discussão toda de pauta política. Executivos e acionistas tentam aumentar lucros e dividendos introduzindo automação que não só justifica cortes, mas opera diminuindo o valor econômico de obras originais humanas. A IA vende a ilusão de que tudo será feito sozinho, sem interferência humana. Bem, a realidade é bem diferente disso com respostas erradas e enviesadas.

Mas é preciso explicar um fato: IA generativa não é algo exatamente ruim. Utilizado com dados em um ambiente fechado, com material licenciado e autorizado pode ser uma boa ferramenta. O problema é quando uma big tech qualquer manda seu robô pegar o que está “de graça” na internet.

A IA utilizada em Arc Raiders é, supostamente, um text-to-speech baseado em gravações de atores reais contratados em vez de material roubado – ou não autorizado – disponível na internet. Mas isso não significa que a produção será melhor, nem que será produzido mais material para o jogo.

Essas promessas de produtividade aumentada não são consolidadas com frequência, apesar das quantidades astronômicas de dinheiro sendo jogadas para normalizá-las. O tempo e dinheiro gasto para ajustes – feito por humanos – normalmente não justificam a utilização de IA… E mesmo assim as empresas tem lucrado muito e mandado muita gente para o olho da rua…

Por Rodrigo Castro

Debochado e inconveniente. Escritor, roteirista e designer de brincadeirinha.

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