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Quando descobri que lidar com egos de adultos podia ser mais difícil do que lidar com adolescentes

Quando eu comecei a dar aula, era jovem, idealista e achava que o maior desafio seria conquistar o silêncio de uma turma de 6º ano depois do recreio. Mal sabia que, no universo escolar, o verdadeiro bicho-papão usava crachá, batia ponto e tinha anos de casa.

Sim, eu era inexperiente. Sim, eu achava que bastava ser dedicada e gostar de ensinar. Mas ninguém me avisou que existia uma fauna bem mais complexa que a dos adolescentes hormonais: o das professoras veteranas que perdiam espaço de queridinhas da galera e não gostavam nadinha disso.

Foi nesse clima nada amigável dos novatos com as veteranas que surgiu a “gincana ecológica”, um projeto da escola para unir turmas em grandes grupos com metas sustentáveis e dinâmicas interativas. Uma ideia ótima, com exceção do pequeno detalhe de que algumas tarefas eram… digamos… pouco ecológicas — tipo confeccionar camisetas personalizadas (não me pergunte, nunca entendi).

Por sorteio, fui escolhida como professora líder de um dos grupos. Me esforcei, organizei horários, e numa dessas iniciativas, marquei um momento rapidinho para pegar os tamanhos das camisetas com os alunos. Tudo alinhado com antecedência, tudo organizado. Só faltava o troféu de “boa vontade do ano” (já que não havia hora-extra, nem banco de horas. Você tinha que se doar pelo bem da escola porque era filantrópica).

Mas aí entra ela: a professora favorita, a estrela da escola, a musa do puxa-saquismo institucional. Aparentemente incomodada com minha empolgação e visibilidade momentânea, ela decidiu mudar o horário de uma atividade dela para exatamente o mesmo momento que eu já tinha agendado. Coincidência? Nem ela tentou fingir.

E foi aí que a cena digna de novela mexicana aconteceu: enquanto eu conversava com os alunos, ouvi gritos vindo do outro lado do pátio. Era ela, berrando que eu estava atrapalhando sua atividade. Como se eu tivesse invadido uma sala de aula com um megafone e um pandeiro.

Claro que a história chegou à direção distorcida. E claro que a direção ficou do lado dela, como sempre fazia, mesmo cientes de que ela estava errada e alertada pela coordenação pedagógica. Recebi uma advertência verbal — o famoso “fica o alerta”, aquele tipo de punição que vem embrulhado num tom passivo-agressivo. Só que não parou por aí: como se não bastasse ter distorcido os fatos da semana, a colega ainda teve a audácia de INVENTAR que eu falava mal dela para os alunos de forma recorrente (e que teria publicado coisas sobre ela nas redes sociais, sendo que na época eu só postava foto de paisagem e letra de música nas redes, nem “metida com política” eu tava ainda).

Sim. Calúnia. O tipo de coisa que, numa escola privada, podia virar uma advertência formal com direito a um documento assinado pela mantenedora. E adivinha? Com três advertências formais, você poderia ser demitida por justa causa. Um sistema bem ecológico… para reciclar funcionários.

No fim, escapei da advertência formal com muita conversa e precisando explicar a mesma coisa para 5 pessoas diferentes, mas saí com uma lição importante: na escola, a política interna às vezes é tão desafiadora quanto o conteúdo de sala de aula. E lidar com egos inflados pode ser bem mais tóxico que o desodorante em spray com perfume que os adolescentes insistem em passar dentro da sala de aula na volta da educação física.

Hoje, quando lembro disso, consigo até rir. Mas na época, foi difícil entender que, no fundo, a escola é um retrato da sociedade com seus jogos de poder, favoritismos e injustiças. E que, para sobreviver, a gente precisa aprender não só a lecionar… mas a jogar o jogo político.

Por Paola Costa

Professora, podcaster e palpiteira. Só falo de temas aleatórios, não reparem a bagunça (ou reparem).

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